O desenvolvimento de jogos 2D ocupa, hoje, uma posição central no ecossistema de games digitais, tanto em termos de volume de produção quanto de relevância estética e comercial. Longe de ser apenas um resquício da era dos consoles clássicos, o 2D consolidou-se como um espaço de experimentação formal, de design de mecânicas precisas e de forte identidade visual. Em ambientes como PC, consoles e plataformas digitais, uma parcela significativa dos títulos independentes — e mesmo de produções de médio porte — adota o plano bidimensional como escolha deliberada, seja pela clareza de leitura, pela capacidade de comunicar rapidamente o “estado do jogo” ao jogador, seja pela viabilidade de produção em equipes reduzidas.

Undertale

Do ponto de vista técnico, o desenvolvimento 2D envolve um conjunto específico de desafios e decisões: gerenciamento de sprites e animações quadro a quadro; uso de tilemaps para construção de cenários; controle refinado de colisão e física 2D; implementação de câmeras, parallax e efeitos visuais que reforcem a sensação de profundidade sem recorrer ao 3D pleno; além da integração com sistemas de interface, áudio e persistência de dados. Nesse contexto, a escolha da engine não é um aspecto secundário: ela determina o modelo de programação (texto ou eventos), a arquitetura interna (componentes, nós, objetos, eventos), o nível de abstração disponível para o designer e o acesso a ferramentas otimizadas para o fluxo de trabalho bidimensional. Analisar engines como Unity, Godot, GameMaker e Construct, portanto, significa compreender não apenas suas capacidades isoladas, mas o modo como estruturam o próprio processo de conceber, prototipar e publicar jogos 2D em escala profissional.

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A Lenda do Herói

A caracterização da adoção e relevância das game engines no desenvolvimento de jogos 2D apresentada neste estudo baseia-se em quatro grupos complementares de evidências. O primeiro provém de estatísticas compiladas a partir da plataforma Steam, em especial por meio do SteamDB Technologies, que realiza o rastreamento automatizado de metadados dos títulos publicados e identifica, entre outros parâmetros, a engine utilizada. Esses dados permitem observar tendências quantitativas de adoção em um dos maiores catálogos de distribuição digital de jogos no mundo. Embora sujeitos a eventuais subdetecções, constituem a fonte mais ampla e empiricamente acessível para análise comparativa entre motores.

O segundo grupo de informações decorre de relatórios independentes e análises de mercado publicados entre 2024 e 2025, cujo foco é examinar incidência de uso, crescimento e viabilidade das principais engines. Esses relatórios adicionam informações e confirmam os padrões observados no SteamDB e auxiliam na interpretação das variações de adoção, especialmente quando correlacionadas ao contexto de publicação comercial.

O terceiro grupo reúne dados provenientes de produções comunitárias e game jams (maratonas de desenvolvimento de jogos), especialmente de eventos como a GMTK Game Jam e outras competições de diferentes portes. Essas bases são particularmente relevantes para compreender o comportamento de equipes independentes quanto à escolha de simulações, prototipagem e fluxo de desenvolvimento, atuando como um indicador qualitativo-quantitativo da preferência por determinadas engines no contexto indie.

Finalmente, o quarto grupo consiste em publicações acadêmicas e estudos comparativos que discutem características arquiteturais, vantagens operacionais e limitações técnicas dos motores analisados. Esses trabalhos reforçam a consistência metodológica da análise, garantindo que os dados empíricos não sejam tratados isoladamente, mas contextualizados dentro de discussões técnicas e conceituais consolidadas.

Em conjunto, essas fontes — SteamDB, relatórios de mercado, estatísticas comunitárias e estudos acadêmicos — oferecem um panorama robusto e multifacetado, permitindo interpretar a adoção das game engines com rigor técnico, clareza metodológica e coerência analítica.

Unity Engine

A Unity configura-se como uma das game engines mais relevantes para o desenvolvimento de jogos 2D no cenário contemporâneo, tanto em produções simples quanto de alta complexidade. A engine faz uso da linguagem C# para programação e trata-se de uma ferramenta multiplataforma, baseada em uma arquitetura componentizada, que permite ao desenvolvedor construir sistemas modulares, reutilizáveis e escaláveis. Embora inicialmente concebida como um motor voltado à tridimensionalidade, a Unity consolidou ao longo de sua evolução um conjunto robusto de recursos dedicados especificamente ao plano bidimensional, tornando-se uma solução amplamente utilizada em jogos 2D comerciais e independentes.

No contexto do desenvolvimento 2D, a Unity dispõe de um pipeline especializado, parte do Universal Render Pipeline (URP), que possibilita o uso eficiente de iluminação 2D, sombras, normal maps e efeitos visuais mais sofisticados, aspectos que conferem ao jogo 2D uma estética contemporânea e, quando desejado, uma aparência híbrida próxima do 2.5D. Associado a isso, o sistema de Tilemap permite a construção organizada de mundos bidimensionais, com tratamento de camadas, colisões e otimização de renderização. O motor de física 2D (Physics2D), integrado nativamente, possibilita interações precisas e estáveis. Os subsistemas de animação, aliados ao controle refinado de câmeras por meio da extensão Cinemachine 2D, viabilizam a implementação de gameplay fluido, responsivo e visualmente coerente. Com esse conjunto modular de componentes, A Unity é capaz de desenvolver praticamente todos os generos de jogos 2D, desde o simples ao complexo, das mais diferentes complexidades.

No Place for Bravery
Infinitevania

Do ponto de vista empírico, os dados provenientes do SteamDB confirmam a predominância da Unity como infraestrutura de desenvolvimento. Em 2025, até o momento, a plataforma registra cerca de 7.650 jogos lançados utilizando Unity, elevando o total acumulado para mais de 58.000 títulos disponíveis na Steam. Tal volume, significativamente superior ao de outras engines, reforça sua posição como tecnologia amplamente adotada no setor, não apenas por equipes profissionais, mas também por estúdios independentes. Essa adoção dificilmente se sustentaria não fosse a maturidade técnica e o amplo ecossistema de suporte — que incluem documentação extensa, recursos educativos, plugins e ferramentas auxiliares.

A presença da Unity no cenário indie ilustra bem sua versatilidade. Jogos como Hollow Knight demonstram que a engine comporta títulos com mecânicas refinadas, ambientes extensos e expressividade artística. Cuphead, por sua vez, comprova que é possível utilizar a engine para composições visuais marcadas por animações quadro a quadro e estética artesanal. Títulos mais recentes como Arcadian Atlas e A Difficult Game About Climbing mostram sua permanência como ferramenta adotada por desenvolvedores independentes em diferentes escalas de produção. Essas produções exemplificam a capacidade da Unity de acomodar tanto pipelines gráficos complexos quanto necessidades sistêmicas centradas em responsividade.

Hollow Knight
9 Kings

Entre suas principais vantagens, destacam-se a maturidade das ferramentas, a flexibilidade para atender desde jogos simples até produções tecnicamente exigentes, a extensa documentação e o fortalecido ecossistema comercial, que facilita a prototipagem, a iteração e a publicação. A natureza multiplataforma do motor, aliada à integração com serviços diversos como analytics, multiplayer e monetização, constitui outro fator determinante para sua popularidade.

Cyberwar: Neon City
Captura de tela nº 3
Unsighted

Todavia, a Unity não está isenta de limitações. Para projetos 2D extremamente simples, a amplitude estrutural da engine pode resultar em sobrecarga desnecessária, tanto conceitual quanto operacional. Além disso, sua alta complexidade sistêmica pode exigir conhecimento técnico mais aprofundado para garantir otimização e desempenho adequados, visto que o motor agrega mecanismos originalmente projetados para 3D. Também é importante que equipes comerciais considerem aspectos de licenciamento e custos, especialmente em projetos de médio ou grande porte.

Em síntese, Unity destaca-se como uma engine de alta confiabilidade, adotada em larga escala para produção 2D, sustentada por dados quantitativos, por um ecossistema consolidado e por uma versatilidade técnica difícil de reproduzir em alternativas concorrentes. Para projetos independentes ou profissionais, constitui uma opção segura, especialmente quando se busca equilíbrio entre refinamento visual, complexidade sistêmica e suporte técnico consistente.

Godot Engine

A Godot consolida-se, no cenário contemporâneo do desenvolvimento de jogos 2D, como uma das alternativas mais tecnicamente eficientes e conceitualmente coerentes para produção independente e autoral. Embora atue também em 3D, é no plano bidimensional que a Godot demonstra um grau de precisão arquitetural e fluidez produtiva que a diferencia de motores mais generalistas. Trata-se de uma engine open source, distribuída sob licença permissiva, o que elimina custos de royalties e permite grande autonomia na manipulação e personalização de seus subsistemas.

Katanaut

Do ponto de vista arquitetural, a Godot adota um modelo baseado em nodes (nós) organizados hierarquicamente no Scene Tree. Diferentemente do paradigma componentizado da Unity, a Godot opera segundo unidades funcionais claramente segregadas (nós de física, nós gráficos, nós de áudio, nós de lógica, etc.), permitindo desacoplamento estrutural, encapsulamento funcional e modularidade de sistemas. Este modelo, singular entre as engines atuais, facilita a reutilização de cenas, a composição de objetos complexos e a adoção de padrões de projeto em níveis sofisticados.

Outro diferencial técnico relevante reside no fato de a Godot possuir um renderizador exclusivamente 2D, construído para operar sem as abstrações intermediárias típicas de motores 3D adaptados ao plano bidimensional. Isso resulta em previsibilidade de desempenho e controle fino sobre a renderização, especialmente em jogos que demandam responsividade elevada, partículas, colisão intensiva ou lógica de IA com múltiplas entidades simultâneas. O sistema de física 2D da Godot, integrado a Bodies (estáticos ou dinâmicos), CollisionShapes parametrizáveis, Areas para detecção de sobreposição e Raycasts para sensoriamento direcional, permite configurar interações precisas com mínima sobrecarga computacional.

Aokaki

O motor de scripting utiliza GDScript, uma linguagem orientada a objetos, de sintaxe limpa, similar a Python, projetada para expressar lógica de jogo de maneira direta, reduzindo verbosidade e promovendo rápida prototipagem. O modelo de Signals, por sua vez, oferece um mecanismo nativo de comunicação desacoplada entre objetos, otimizando interações complexas sem a necessidade de observadores externos, event managers abrangentes ou dependência de herança excessiva.

Em termos quantitativos, dados do SteamDB Technologies revelam crescimento exponencial no uso da Godot na Steam. Até o momento, em 2025, são registrados 1.044 jogos lançados utilizando o motor, totalizando mais de 3.100 títulos acumulados na plataforma. Embora o volume seja inferior ao observado na Unity, a curva de crescimento da Godot destaca-se por sua aceleração consistente, evidenciando um fenômeno de adoção especialmente intenso no contexto indie, onde autonomia, custo e modularidade constituem fatores decisivos.

Dreamed Away
Until Then

Esse crescimento é corroborado pelo comportamento observado em eventos comunitários de desenvolvimento, como as Game Jams, onde o motor apresenta desempenho notável. Na edição mais recente da GMTK Game Jam, por exemplo, a Godot representou 37% das submissões, aproximando-se significativamente da Unity, que registrou 43%. Esses dados indicam que a engine deixou de ser uma alternativa e passou a constituir uma das principais ferramentas de protótipos, experimentos lúdicos e jogos independentes em escala global.

Entre os exemplos bem-sucedidos desenvolvidos em Godot destacam-se Brotato, cuja complexidade sistêmica em termos de densidade de entidades, IA e responsividade comprova a eficiência do motor, e Cassette Beasts, que evidencia a capacidade da engine de lidar com RPGs 2D de estética refinada e mecânicas híbridas. Esses e outros casos demonstram que a Godot não apenas sustenta projetos independentes, mas o faz com performance, consistência e coesão arquitetural.

The Garden Path
Captura de tela nº 0
Blastronaut

Como qualquer ferramenta de engenharia, a Godot apresenta tanto vantagens quanto desafios. Entre os pontos fortes destacam-se a curva de aprendizagem reduzida, a clara coerência arquitetural, a agilidade de prototipagem, o modelo open source e a ausência de custos de licenciamento. Tais características tornam-na particularmente atrativa para estúdios menores e para equipes que priorizam controle técnico e autonomia. Por outro lado, a engine ainda apresenta ecossistema comercial reduzido quando comparada à Unity, além de requerer, em determinados contextos, cuidado adicional em fluxos multiplataforma, especialmente no que diz respeito à publicação em consoles e em pipelines técnico-gráficos de maior escala.

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Em síntese, a Godot constitui hoje um motor tecnicamente sólido, arquiteturalmente elegante e estrategicamente coerente para desenvolvimento de jogos 2D. Com crescimento expressivo, forte adoção independente, curva de entrada favorável e amadurecimento contínuo de suas ferramentas, a engine se posiciona como uma das mais competitivas alternativas contemporâneas dentro do panorama bidimensional mundial, sobretudo para equipes que buscam liberdade técnica, transparência estrutural e eficiência produtiva.

GameMaker

A GameMaker consolidou-se historicamente como uma das engines mais especializadas no desenvolvimento de jogos 2D, e permanece, até os dias atuais, como uma das ferramentas de referência para produções independentes que buscam elevada responsividade mecânica e estética autoral. Enquanto engines generalistas, como Unity, carregam subsistemas inicialmente direcionados ao 3D, a GameMaker opera com foco exclusivo no plano bidimensional, o que lhe confere coerência arquitetural, simplicidade de ciclo de produção e eficiência de execução.

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A infraestrutura conceitual da GameMaker organiza-se em torno de Rooms e Objects, que funcionam como equivalentes, respectivamente, a cenas e instâncias sistemicamente encapsuladas. Por meio de um modelo fortemente orientado a eventos, a engine adota uma programação fundamentada em ciclos lógicos como Create, Step, Draw e Collision, permitindo que o desenvolvedor implemente comportamentos de forma clara e direta, sem necessidade de arquiteturas complexas ou hierarquias profundas. A GML (GameMaker Language), linguagem nativa da engine, apresenta sintaxe enxuta, acessível e voltada à expressão de lógica de gameplay, sendo uma opção que concilia facilidade de entrada com capacidade de controle preciso.

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Do ponto de vista gráfico, a GameMaker permite a manipulação detalhada de sprites, máscaras de colisão, atlas e animações, o que a torna especialmente adequada para pixel art e estética retro, embora não restrita a elas. A engine oferece controle de colisão pixel-perfect, além de ajustes diversos de bounding boxes, proporcionando previsibilidade e fidelidade mecânica em jogos que demandam precisão temporal e espacial. A arquitetura estrutural enxuta repercute diretamente no desempenho, evitando overheads desnecessários e fazendo da GameMaker uma opção particularmente eficiente para jogos baseados em tempo de reação, como shooters, hack-and-slash e arcades.

No que diz respeito à adoção, a GameMaker mantém presença estável na Steam, sobretudo no segmento indie. Embora com proporções inferiores à Unity, sua participação caracteriza-se por forte representatividade em jogos pixelados e autorais. Entre os títulos de maior notoriedade, destacam-se Undertale, obra amplamente reconhecida por sua abordagem narrativa e mecânica; Hyper Light Drifter, cuja fluidez estética e responsividade são referências na indústria; e Hotline Miami, notório pela precisão temporal, agressividade mecânica e design minimalista de sistemas. Essas produções evidenciam a capacidade da GameMaker de sustentar obras de alto impacto artístico e mecânico, mesmo quando operadas por equipes reduzidas.

Hyper Light Drifter
Hotline Miami

Em termos quantitativos, os dados do SteamDB Technologies indicam que a GameMaker responde por um número considerável de publicações em 2025, mantendo estabilidade em jogos 2D e consolidando-se como ferramenta preferencial para workflows que privilegiam prototipagem rápida, comportamentos responsivos e design centrado no gameplay. Embora o volume de títulos publicados seja inferior ao observado em Unity, os dados revelam uma forte presença qualitativa, ou seja, títulos reconhecidos, bem avaliados e frequentemente citados como referência de construção sistêmica.

Entre as vantagens mais evidentes da GameMaker destacam-se sua simplicidade estrutural, a coerência da arquitetura 2D, a curva de aprendizagem amigável e a eficiência operacional para lidar com mecânicas sensíveis a timing. A engine favorece o foco no design do jogo e na experiência do jogador, eliminando parte das preocupações tecnológicas que motores mais generalistas introduzem.

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Temple of Revi
Railgunners

Por outro lado, algumas limitações são inerentes ao seu design. A GameMaker não possui a mesma amplitude do ecossistema de integração disponível em motores multiplataforma generalistas, o que pode restringir estúdios que demandam fluxos complexos de rede, monetização extensiva ou integração comercial multicanal. Ainda, embora suporte exportação para múltiplas plataformas, o processo pode exigir planejamento de licenciamento, especialmente para publicações comerciais em grande escala.

Moonleap
Fields of Mistria

Em síntese, a GameMaker ocupa posição única no panorama das engines 2D: concentra simplicidade e eficiência, preserva coerência arquitetural e oferece uma experiência produtiva orientada ao essencial. É particularmente adequada para jogos 2D que demandam resposta mecânica precisa, construção autoral e ciclo iterativo rápido, sendo, portanto, uma alternativa tecnicamente sólida e comparativamente mais enxuta às engines generalistas quando a ambição do projeto reside fundamentalmente na bidimensionalidade.

Construct

A engine Construct apresenta-se, no panorama contemporâneo do desenvolvimento de jogos 2D, como uma solução orientada à acessibilidade produtiva, ao protótipo ágil e à implementação baseada em eventos, mantendo plena coerência com propostas visuais bidimensionais e com títulos de perfil casual, experimental ou educacional. Ao contrário de motores que priorizam expansão sistêmica ou multiparadigmas de arquitetura, a Construct assume deliberadamente a função de “motor de aplicação direta”: a lógica é construída em event sheets, evitando sintaxe textual tradicional e favorecendo um fluxo baseado em regras de causa e efeito.

 no Steam
Rift Racoon

O modelo event-driven que fundamenta a Construct elimina, em grande parte, a sobrecarga conceitual associada a hierarquias, herança complexa, interfaces de abstração ou manipulação profunda de estados. Isso se traduz em um ambiente extremamente favorável à iterações curtas, reduzindo o tempo entre concepção e protótipo funcional. Porém, ao mesmo tempo, esse modelo não inviabiliza aprofundamento técnico: o motor permite extensões em JavaScript, fornecendo flexibilidade adicional a desenvolvedores que desejam extrapolar os limites do paradigma visual.

Vengeful Guardian: Moonrider

No plano gráfico, a Construct disponibiliza suporte nativo a recursos fundamentais à produção 2D, incluindo sprites, tilemaps, parallax, manipulação de camadas, máscaras de colisão e renderização via HTML5/WebAssembly. Essa característica técnica a destaca especialmente no contexto de distribuição web e mobile casual, permitindo que jogos sejam executados diretamente em browsers, sem dependência de compilações complexas ou pipelines extensos de empacotamento. Embora sua presença na Steam seja menos volumosa que a Unity, GameMaker ou a Godot, a Construct possui uma forte penetrabilidade em ambientes educacionais, didáticos e laboratoriais, servindo como ponto de entrada à engenharia de jogos e como ferramenta prototípica eficiente para designers e pesquisadores.

Creature Keeper
Cyber Shadow

Do ponto de vista de adoção, a Construct apresenta dados moderados no SteamDB, ocupando um nicho que, ainda que minoritário, reflete estabilidade de uso em jogos 2D de baixa e média complexidade. Por não apresentar a ambição de substituir engines generalistas em larga escala, seu desempenho deve ser interpretado segundo sua proposta original: trata-se de uma engine, geralmente, direcionada a produções enxutas, experimentais, interativas e, muitas vezes, didáticas. Desse modo, a mensuração de sua relevância não se dá apenas em número bruto de publicações, mas na consistência com que ela atende a fluxos produtivos específicos.

No campo dos exemplos, embora a Construct possua menos títulos altamente midiáticos, é amplamente utilizada para jogos de desempenho casual, protótipos de mecânicas e experiências narrativas leves. Obras autorais recentes evidenciam a capacidade da engine de trabalhar com pixel art, interação responsiva e lógicas de progressão simplificadas. Seu uso é notável em web platforms e em jogos que se beneficiam da ausência de overhead estrutural típico de motores mais complexos.

Bumballon

Entre as vantagens da Construct destaca-se sua curva de aprendizagem extremamente reduzida, que elimina a barreira inicial de entrada e democratiza o acesso ao desenvolvimento de jogos. A engine propicia rapidez de prototipagem, reduz custo de implementação e favorece experimentação tanto em contextos profissionais quanto educacionais. A natureza HTML5/WebAssembly de sua plataforma permite distribuição instantânea e uso em dispositivos de ampla base instalada, o que a diferencia, em termos estratégicos, das engines que dependem fortemente de instaladores e builds multiplataforma.

Small Saga

Contudo, a Construct não está isenta de limitações. Sua arquitetura, embora coerente para projetos de perfil simples a mediano, não oferece a mesma elasticidade estrutural observada em Unity, Godot ou GameMaker quando se trata de projetos extensos, com múltiplas camadas de abstração, volume sistêmico elevado ou requisitos específicos de otimização. Além disso, para equipes que necessitam explorar a engenharia de software de forma profunda, a ausência inicial de scripts textuais pode restringir o domínio de modelos arquitetônicos formais.

Em síntese, a Construct configura-se como uma solução tecnicamente consistente, desde que analisada no âmbito de seus objetivos: rapidez, clareza, acessibilidade e foco no 2D direto. Trata-se de um motor que cumpre sua função com precisão — sem excessos, sem redundâncias e sem promessas de generalidade universal. Para jogos 2D casuais, protótipos experimentais, aplicações educacionais ou fluxos de design centrados na iteração rápida, a Construct constitui uma alternativa funcional, estratégica e produtivamente racional.

Conclusão 

A análise contemporânea das quatro principais engines voltadas ao desenvolvimento de jogos 2D demonstra que a escolha de uma ferramenta não deve ser guiada por critérios genéricos, mas por fatores diretamente relacionados ao perfil e aos objetivos de produção. Entre esses fatores, destacam-se a dimensão do projeto, que determina a necessidade de pipelines simples ou escaláveis; o gênero do jogo, que impacta diretamente a arquitetura, as ferramentas e a responsividade requeridas; e o nível de conhecimento técnico da equipe, que pode favorecer engines mais acessíveis ou ferramentas mais robustas.

Super Mombo Quest

Elementos como licenciamento também influenciam significativamente a decisão, uma vez que projetos comerciais de maior porte exigem análise criteriosa de custos e modelos de royalties, enquanto projetos independentes podem beneficiar-se de engines open source. Outro fator determinante é a plataforma alvo, já que a distribuição em PC, consoles, mobile ou web demanda capacidades específicas de exportação e suporte. A escalabilidade torna-se ainda mais relevante em jogos que evoluem em complexidade, exigindo engines capazes de acomodar crescimento sistêmico sem comprometer desempenho. Finalmente, a comunidade e o suporte técnico exercem papel crucial, tanto no acesso a documentação e boas práticas quanto na resolução de desafios técnicos recorrentes.

Blazing Chrome

Assim, enquanto Unity oferece amplitude funcional e maturidade multiplataforma, Godot destaca-se pela coerência estrutural e liberdade do modelo open source; GameMaker evidencia simplicidade e precisão mecânica orientadas ao 2D clássico; e Construct atende fluxos centrados em prototipagem ágil e acessibilidade produtiva. Compreender como cada engine se relaciona com os fatores de decisão — dimensão, gênero, conhecimento, licença, plataforma alvo, escalabilidade e suporte comunitário — é o passo essencial para assegurar que a escolha tecnológica não seja apenas funcional, mas estrategicamente alinhada às necessidades reais do projeto de jogos 2D.