O ano era 1991, eu tinha nove para dez anos de idade, minha família e eu havíamos mudado para um novo bairro na metade do ano anterior e, por conta desta mudança, eu ainda não tinha muitos amigos fora da escola.

A minha grande diversão nas tardes após a aula era percorrer o bairro onde eu morava, e que pouco conhecia, em busca de novas locadoras onde eu pudesse alugar jogos diferentes para o meu querido Master System que ganhei do meu pai um pouco antes da mudança.

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Em uma das minhas incursões desbravando o bairro, passei por um pequeno bar e de repente algo me chamou a atenção: eu ouvi uma voz digitalizada gritando algo que naquele primeiro momento foi incompreensível como também uma música que sem dúvida alguma pertencia a um jogo de videogame.

Na mesma hora meu “sentido de aranha” de jogador disparou e fui tomado por uma curiosidade absurda para tentar descobrir a fonte daqueles maravilhosos sons.

Em uma rápida varredura dentro do bar, identifiquei em um canto um gabinete todo vermelho sem nenhuma inscrição na lateral, apenas formas geométricas pintadas em preto. Jogando neste gabinete estava um adolescente de aproximadamente quatorze anos.

Em um primeiro momento fiquei com um pouco de vergonha de me aproximar para ver qual era aquele jogo com sons tão particulares. Mas bastaram quinze segundos aproximadamente para eu vencer a minha timidez e me aproximar do jogador.

Logo na primeira olhada para a tela foi possível identificar que se tratava de um jogo de luta. Tudo parecia muito simples. Diferente dos jogos que eu estava acostumado a jogar, não havia uma progressão lateral de tela. O estágio era praticamente estático e a luta acontecia apenas entre dois personagens. Era uma luta mano a mano.

Fiquei por alguns bons minutos acompanhando a jogatina do garoto com os olhos vidrados na tela e aquilo me cativou. Pensei comigo mesmo: “eu consigo fazer melhor do que ele”. Logo após esse pensamento com um toque de arrogância, resolvi dar uma olhada nos controles da máquina para entender como funcionava a jogabilidade.

Logo me dei conta de que, além do manche “analógico”, havia SEIS botões de comando.

No mesmo instante, toda aquela minha autoconfiança descera pelo ralo. Como assim SEIS botões? Eu esperava um botão de soco e um de chute. No máximo um botão adicional para os pulos. Aquilo me deixou impressionado, mas em um primeiro momento imaginei que a quantidade grande de botões seria para executar os golpes especiais, as famosas “magias”. Doce engano.

A partida durou aproximadamente quinze minutos e, ao final, eu estava com uma mistura de sentimentos em meu coração. Metade de mim queria experimentar esse jogo novo e a outra ainda estava assustada com aquela quantidade de botões. De qualquer maneira eu não tinha dinheiro e, por isso, não seria possível jogar naquele momento. Antes de ir embora, resolvi esperar um pouco até aparecer a tela de título. Eu precisava saber o nome daquele jogo. Street Fighter 2!

No dia seguinte na escola, comentei com alguns amigos da sala que gostavam de jogar videogames e para minha surpresa eles já tinham visto máquinas parecidas espalhadas pelo bairro. Em poucos dias Street Fighter 2 se tornou o único assunto discutido entre a molecada que gostava de videogames. Foi uma verdadeira febre.

Demorei mais ou menos uma semana para tomar coragem e experimentar aquele jogo. Sim, a quantidade de botões realmente me assustou. Mas já estava decidido: na próxima vez que minha mãe me pedisse para buscar algo no mercado o troco já tinha destino certo. Eu jogaria Street Fighter 2 pela primeira vez.

Na volta do mercado tomei coragem e entrei no bar. Comprei uma ficha e fui para a máquina. Para minha sorte, tinha um menino jogando e dessa vez o jogador tinha quase a minha idade.

[intense_blockquote] Tomei coragem e perguntei:
– Cara, para que tantos botões? O que eles fazem?
A resposta foi mais simples do que eu esperava:
– São três botões de socos e três botões para chutes. Fraco, médio e forte.
E foi assim que finalmente eu descobri o que aqueles tantos botões faziam.
[/intense_blockquote]

Não demorou muito e logo chegou minha vez de jogar. Lembro-me de respirar bem fundo antes de colocar a ficha na máquina e começar a jogatina. Na tela de seleção de personagens demorei alguns segundos, mas acabei escolhendo Ken Masters, pois era com ele que a maioria das pessoas jogavam. E até hoje é o meu personagem favorito.

Minha ficha não durou nem 5 minutos. Perdi os 2 rounds, e como já podem imaginar não consegui soltar nenhuma magia ou golpe especial. Mas nem por isso a experiência foi frustrante. Eu saí da partida maravilhado e me sentia desafiado a ficar bom naquilo, e para tal feito a primeira missão seria descobrir como atacar com os golpes especiais.

No dia seguinte na escola, contei a maior vantagem para os amigos, dizendo que tinha jogado, mas ao contrário do que aconteceu realmente eu disse que cheguei bem longe no jogo. Coisa de criança. Não demorou muito para alguém me dizer alguns comandos para aplicar as tais “magias”.

Nas minhas próximas jogatinas comecei a melhorar gradativamente no jogo, mas o famoso Hadouken demorou para sair. Demorou quase tantos episódios quanto o Ruy no anime Street Fighter 2 Victory, que passava nas manhãs de sábado do SBT. Eu fazia os comandos, mas não tinha sucesso na execução.

Hoje sei que o problema era o timing do negócio, mas na primeira vez que eu consegui meus olhos se encheram de lágrimas e eu gritei junto com o Ken: HADOUKEN!!!

O fato é que, desde então, nunca mais parei de jogar Street Fighter. Tenho um carinho todo especial pela franquia e por esse jogo, especificamente. Tenho uma história muito marcante com Street Fighter 2 jogando com o meu pai, mas isso é assunto para outra crônica.

Vida Longa aos lutadores de rua e HADOUUUUUKKKKEEEENNNNN!!!