Muito tem-se falado, ultimamente, sobre o vício em videogames, haja vista que a OMS – Organização Mundial da Saúde incluiu na obsessão por games na 11ª CID – Classificação Internacional de Doenças em junho deste ano.
Mas o que se entende por vício? Em uma breve definição, temos que é um hábito repetitivo que degenera ou causa algum prejuízo ao viciado e aos que com ele convivem. No contexto gamer, em linhas gerais e de forma superficial, à medida em que o jogador de videogame tenha um padrão de jogatina tão intenso que se torna uma compulsão, e isso começa a atrapalhá-lo em suas demais atividades cotidianas, como estudo, trabalho e relacionamentos sociais, o vício pode (e deve) ser diagnosticado e tratado por profissionais competentes.
Contudo, o tema vem sendo tratado somente considerando o vício ou a compulsão em JOGAR VIDEOGAMES. Mas o colecionismo não seria também uma espécie de vício? Em minha modesta e leiga opinião, sim. E aqui, passo a relatar uma experiência própria.
Quem me conhece sabe que coleciono itens relacionados a videogames como revistas, consoles e jogos. Venho há alguns bons anos alimentando essa paixão, em especial pelas plataformas antigas, ou retrô – como dizem. No entanto, recentemente, comecei a perceber o quão grande essa paixão ficara em minha vida. Minhas conversas só giravam em torno desse assunto, não que isso seja ruim ou grave, nada mais justo que falarmos sobre o que gostamos.
Mas além disso, eu passava o tempo todo à procura de itens em sites e grupos de internet e, muitas das vezes, nem ao menos sabia o que estava procurando. Já cheguei ao absurdo de ficar das 18h até tarde da noite olhando itens disponíveis nesses sites. Claro, com essa obsessão, veio junto um gasto exagerado de dinheiro. Esse tempo e recursos financeiros empregados poderiam ser melhor utilizados de outra maneira, como dando atenção à família, praticando uma atividade física, estudo, etc.
Para mim, já era inevitável a chamada “caçada”. E junto dela, vieram a angústia em não encontrar determinado item, a ansiedade para achar algo que nem mesmo sabia o que era ou se realmente o queria e necessitava, uma angústia muito forte quando o MEDO de não comprar um determinado jogo e ele nunca mais aparecer (e olha, sempre aparece de novo) batia. Até no meio do trabalho eu me pegava nessa busca desenfreada.
Dessa forma, comecei a perceber que estava viciado no colecionismo, ou na caçada gamer, como queiram. Percebi que isso tudo estava me fazendo mal, ao menos da forma com que estava acontecendo. A coleção se tornou maior que minha vida, meus amigos e minha família. Foi claro como a luz do dia que eu estava viciado. Felizmente, percebi isso a tempo de sofrer maiores problemas.
Mas como foi que resolvi? Em primeiro lugar, tomei consciência de que tinha um problema e que precisava ser resolvido. Comecei, então, a buscar novas atividades como brincar mais com meus filhos, JOGAR MAIS O QUE JÁ TENHO NA COLEÇÃO, entre outras coisas. Pensei até em vender tudo e dar um basta nessa história. Mas essa seria a solução mais adequada? Pensando nisso e acreditando que a resposta a essa pergunta seria um sonoro NÃO, e que provavelmente eu teria um problema maior caso tomasse uma atitude drástica e impensada, resolvi procurar uma ajuda psicológica através de terapia.
Desse modo, pensei em falar com o Rafael Marques, que além de profissional capacitado na área, entenderia o que eu teria a dizer, pois ele também coleciona e gosta das mesmas coisas que eu. A princípio fiquei reticente e com vergonha, mas resolvi, mesmo assim, conversar com ele e expor meus problemas a fim de saber se ele poderia me ajudar.
Foi a melhor coisa que fiz. Com a sua ajuda consegui entender adequadamente meus anseios e minhas angústias. Vi de um melhor maneira tudo de ruim que estava acontecendo e como isso estava me afetando e, provavelmente, afetando as pessoas que convivem comigo.
Por outro lado, também consegui enxergar outros tantos pontos positivos no mundo de coleção de videogames e percebi o quão importante são em minha vida e minha história, como os amigos que fiz, a oportunidade de escrever para uma publicação gamer, que era um sonho de infância, entre tantas outras coisas. Não é um fim na aquisição de itens e na coleção, mas agora tenho controle sobre o que realmente quero, quando quero e como quero. Ou seja, percebi que existe um lado bastante positivo e que, de fato, a saída não era vender tudo. Provavelmente eu mudaria o problema para outro ponto.
Dessa forma, me conheci melhor em relação à minha coleção e ao mundo que a rodeia. Pude compreender meus sentimentos e conseguir me adaptar a uma nova realidade onde a coleção ainda é muito importante para mim, mas consigo ter autocontrole e refletir melhor na compra de um item, sem impulsão, angústia e desespero.
Isso me levou a melhor aproveitar tudo que já tenho e, principalmente, deixou minha família, meus amigos e EU mais felizes. A coleção é muito importante, é muito legal manter viva a história dos videogames, mas ela jamais pode ser maior que sua vida, sua família e amigos. Pense nisso.